Guarda Civil Metropolitano da Cidade de São Paulo
É necessário pensar as características fundamentais do Estado
democrático para examinar a influência da democracia política
na condução do sistema de segurança pública estadual. Além
disso, devem-se compreender a estrutura básica de
funcionamento das organizações policiais e as razões que
norteiam a ação policial, para que essa abordagem teórica
possa evitar, por exemplo, enganos como o de atribuir
como traço ou problema específico da polícia paulista algo
comum a várias outras instituições.
Somente no estado de direito, o cidadão pode ter pleno
acesso aos seus direitos civis, políticos e sociais.
Os direitos civis relacionados à cidadania são, entre
outros, referentes à liberdade individual, como a liberdade
de pensamento, de imprensa, de ir e vir, de culto religioso
e de acesso à justiça. Os direitos políticos, por sua vez,
relacionam-se à liberdade de participar do exercício do
poder. Por fim, os direitos sociais dizem respeito à
prerrogativa de se ter uma vida com o mínimo de
bem-estar, com a responsabilidade do Estado de
garantir o acesso a tais direitos, de acordo com os
padrões de cada sociedade.
O funcionamento do estado democrático depende de um
sistema legal que preserve as liberdades e as garantias
políticas, proteja os direitos civis de toda a população,
tenha redes de responsabilidade e mecanismos de
fiscalização e punição dos agentes do Estado que cometam
ilegalidades no exercício da função. Tais mecanismos
fazem parte do sistema de accountability, de
responsabilização, para a proteção da ordem democrática .
Um sistema democrático consolidado conta com cinco bases
de sustentação: sociedade civil livre e ativa, com grupos
auto-organizados; sociedade política relativamente
autônoma para exercer controle sobre o poder público
e o aparato estatal; estado de direito que assegure
liberdades e garantias individuais; burocracia estatal
que opere segundo os padrões legais e uma
sociedade econômica institucionalizada, com relações
mercado-indivíduo reguladas pelo Estado.
Tais bases interagem entre si de forma complementar,
uma esfera fortalece e protege a outra. A democracia
pode ser considerada um regime estruturado em esferas
de mediações entre o Estado e a sociedade para resolver
questões sociais, de cidadania e governo, com
transparência, legalidade e participação política dos
cidadão.
cidadão.
A condição básica para a criação da democracia
política moderna foi a constituição do Estado como
instituição detentora de soberania jurídico-política e do
monopólio do uso da violência física legítima, em
oposição ao caráter descentralizado do poder medieval,
dividido entre diversos núcleos de poder, como:
reinos, senhorios, organizações religiosas e corporações
de ofício.
Assim, somente o Estado, soberano em seu território,
tem a prerrogativa de utilizar a força de modo legítimo. O
caráter de legalidade de suas ações é conferido pelo
controle e pelas limitações impostas pela própria legislação
estatal. O Estado tem por fim último o bem comum e a
manutenção da ordem pública, da paz social, cumprindo
a polícia a tarefa de zelar pelo não rompimento da ordem
pública e tomar as providências cabíveis para a sua proteção .
A polícia é, portanto, uma instituição especializada no
controle social interno para, se preciso, dentro dos limites
legais, utilizar-se de violência ao visar à preservação
emergencial da ordem. Sua função é resolver, de modo
rápido, situações desagradáveis e, muitas vezes, inesperadas
. Previne crimes com rondas ostensivas, reprime a
execução de delitos e conduz os infratores para o devido
julgamento. Protege a vida e a propriedade e é um
mecanismo oficial de gerenciamento de relações entre os
indivíduos. Além do controle social, ainda presta serviços
à comunidade.
A polícia é parte integrante da burocracia estatal,
organização complexa responsável por administrar
a esfera pública, estruturada na autoridade racional
hierarquizada, na formalidade nas relações entre os cargos,
em um sistema de obrigações e privilégios definidos por
normas. Cada ramo de sua estrutura tem uma área de
competência técnica específica, e seus profissionais devem
passar por uma rigorosa sistemática de disciplina e
controle do seu desempenho, além de terem qualificação
e conhecimentos à altura do cargo.
Alguns traços, porém, são inerentes à atividade policial como,
por exemplo, o poder de polícia, a presença do perigo
em potencial e a imposição de autoridade que constroem a
personalidade do trabalho, não como um fenômeno psicológico
individual, mas como uma cultura socialmente gerada .
A instituição policial é um complexo órgão burocrático; de
cultura e poder peculiar o qual sob certos aspectos, distancia-se
do tipo ideal de organização burocrática weberiana.
Organizações policiais como a americana e brasileira têm
um controle interno rígido e centralizado; porém ineficaz,
pois regulam, com detalhe, questões ligadas à hierarquia,
às decisões administrativas da corporação, à vestimenta
do policial, principalmente, em instituições de doutrina militar
como a Força Pública.
De fato, a atuação do policial nas ruas nunca está sob inteiro
comando dos superiores hierárquicos, ou devido à própria
natureza do trabalho de policiamento que é a de tomar decisões
rápidas e complexas em situações imprevisíveis, ou seja
por falta de interesse dos próprios superiores em um controle
mais efetivo, ou ainda, como conseqüência do protecionismo
existente entre policiais de mesma graduação em não divulgar
desvios de seus pares. Para os policiais, se um colega está
em perigo, não importa se está certo ou errado, merece
ajuda e apoio.
Na Força Pública, oficiais chegaram mesmo a ignorar atos
de indisciplina do baixo escalão como um modo de veladamente
demonstrar sua concordância com as reivindicações
salariais de seus soldados
O espírito de corpo encobre as violações cometidas
dos superiores hierárquicos e do mundo externo, sociedade
e esfera política.
É comum, no entanto, qualquer instituição ter instrumentos
para garantir sua perpetuação no tempo. Entre os profissionais,
forma-se uma rede de solidariedade interna a ser mobilizada
em caso de dificuldades, de perda de direitos ou de possibilidade
de punição. Essas duas frentes de defesa, institucional e
a criada entre os trabalhadores, podem se unir em caso de
grave ameaça à existência da corporação.
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