domingo, 3 de julho de 2011

Narcossalas em lugar da Cracolândia


Cracolândia em São Paulo

Os restos humanos que caminham em meio ao lixo e as drogas, nas ruas da Cracolândia, compõem um dos cenários mais tristes da cidade de São Paulo. São centenas de pessoas em processo de destruição, doentes e alucinados que, enquanto esperam a morte, única esperança que têm, se alimentam com crack. As soluções ensaiadas até aqui não oferecem perspectivas positivas. A reurbanização proposta pela prefeitura esquece da saúde pública; e a remoção citada por Gilberto Kassab, em sabatina na Folha de SP, tem caráter policialesco e autoritário. Não há histórico no mundo de que estas políticas tenham servido para melhorar a qualidade de vida das pessoas e da cidade.

São Paulo poderia ser inovadora e propulsora de uma guinada na história do combate às drogas se ouvisse o que disse Walter Maierovitch, presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais Giovanni Falconi, na conversa que tivemos na segunda-feira, no quadro Justiça e Cidadania, do Jornal da CBN. Incentivador das políticas sociossanitárias, ele lembrou a experiência desenvolvida em Frankfurt, onde foram implantadas as primeiras narcossalas do mundo, em 1994, recomendada pela ganhadora do Nobel de Medicina Françoise Barre Simousse.

As narcossalas, salas seguras para consumo, são espaços onde o uso da droga é controlado e servem de aproximação do dependente químico profissionais qualificados, que oferecem além de assistência médica e psicológica permanentes, internação voluntária em comunidade terapêutica e políticas de emprego.

Em 10 anos do programa, a cidade alemã que contava 6 mil drogados vagando pelas ruas viu cair pela metade o número de dependentes, reduziu consideravelmente a quantidade de usuários sendo atendidos com doenças graves, com alto custo para a rede pública, diminuiu o número de pessoas mortas por overdose e houve queda no índice de delitos relacionados ao consumo de droga.

O programa de Frankfurt contaminou mais oito cidades na Alemanha e foi implantado na Espanha, Suíça e, inclusive, em alguns estados americanos, onde usuários, a maioria dependente de heroína, vencem crises de abstinência com uso de metadona, explica Maierovitch. E nestes lugares, as narcossalas deram certo tanto em relação à redução da demanda quanto aos aspectos e práticas humanos, solidários e de reinserção social.

Para que as narcossalas substituissem a Cracolândia, em São Paulo, além de mudanças na lei nacional sobre drogas, haveria necessidade de uma transformação no olhar da sociedade e do poder público, algo que me parece, neste momento, ainda estar muito distante da nossa realidade. O que me leva a crer que continuaremos a assistir a degradação humana em plena praça pública, lamentavelmente.

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